quarta-feira, 11 de junho de 2014

Os jihadistas conquistam a principal cidade do norte do Iraque

Os moradores de Mosul e Baiji fogem de suas casas. / REUTERS LIVE!
Extremistas sunitas ligados à Al Qaeda tomaram na terça-feira o controle de Mosul, a cidade maior cidade do Iraque, e de seis distritos na província de Kirkuk. Trata-se de um golpe sem precedentes contra o Governo de Nuri al Maliki. O primeiro-ministro, que depois de ganhar as eleições legislativas de abril busca apoios para seu terceiro mandato, reconheceu a perda de “zonas vitais” capital de Nínive e pediu ao Parlamento que decrete estado de emergência. Resta ver se os deputados, que se reunirão na quinta-feira, aprovarão uma lei que ampliaria ainda mais os poderes de Al Maliki, cuja gestão tem se mostrado muito controversa. Durante a noite, centenas de milicianos do Estado Islâmico de Iraque e do Levante (EIIL) e outros grupos associados tomaram a principal base militar de Mosul e soltaram os presos de três celas, sem, ao que parece, resistência dos guardas. Depois, tomaram o controle do escritório do governador, das delegacias de polícia, de redes de televisão, do aeroporto e de outros prédios oficiais. Cerca de 150 mil dos 2 milhões de habitantes da cidade fugiram, segundo estimativas oficiais. “Não vamos que permitir que Mosul fique sob o controle de terroristas. Fazemos um apelo a todas as organizações internacionais para que apoiem o Iraque na luta contra o terrorismo. O mundo inteiro sofrerá se esse terrorismo se estender”, declarou o primeiro ministro durante uma mensagem emocionada ao país, transmitida em cadeia nacional de televisão. Além de pedir pelo estado de emergência, Al Maliki também fez um apelo à população civil e ofereceu dar armas a quem se oferecer como voluntário para “defender a pátria”. O presidente do Parlamento, Osama al Nujaifi, denunciou que os soldados abandonaram seus postos logo após o início do ataque, em um ato que chamou de “negligência no cumprimento do dever”. Al Nujaifi, que é natural de Mosul e irmão do governador, Atheel al Nujaifi, foi o primeiro a dar o alerta. “Toda a província de Nínive caiu nas mãos dos insurgentes”, declarou durante uma entrevista coletiva, segundo a agência France Presse. Muitas famílias que permanecem em suas casas não têm nem eletricidade nem água corrente De fato, os milicianos do EIIL já controlavam parte da província havia meses, e cobravam taxas dos carros para permitir o trânsito de mercadorias. O ataque a Mosul também não aconteceu de repente. Uma primeira tentativa, na sexta-feira passada, foi rechaçado pelas forças de segurança e, na segunda-feira, o próprio governador havia convocado a população para que “se mantivessem firmes em seus bairros e os defendessem frente aos estrangeiros”. Segundo a BBC, Atheel al Nujaifi fugiu à noite, antes que caísse a sede do Governo da província. Mosul, a 350 quilômetros ao norte de Badgá, é a segunda cidade importante que os jihadistas invadiram neste ano; em janeiro, eles tomaram Faluya e amplas zonas do restante da província de Al Anbar. Desde então, Al Maliki tenta, sem êxito, recuperar o controle, mas a militarização do problema só conseguiu alienar mais a população sunita (maioria na província) que se sente marginalizada do poder pelos xiitas que controlam o Governo, dando combustível aos extremistas. No entanto, o primeiro-ministro não tem problemas apenas com a comunidade árabe sunita, como também acabou cultivando uma inimizade com os curdos, seus companheiros de coalização, e até com alguns aliados xiitas, devido a suas tendências autoritárias. Por isso, o pedido ao Parlamento desperta receio. A declaração do Estado de emergência lhe daria poderes extraordinários para efetuar prisões e declarar toque de recolher, algo que causa dúvidas em seus adversários políticos. “Sua estratégia não funcionou. Ele nunca vai conseguir controlar a revolta dos sunitas com forças xiitas. É preciso envolver os sunitas moderados, de quem ele se distanciou”, disse o analista iraquiano Ghassan al Attiayah à TV Al Jazeera. Horas depois, e ainda sob o impacto da tomada de Mosul, chegavam notícias de que os rebeldes sunitas haviam tomado o controle de seis distritos da província de Kirkuk, uma zona petrolífera que a região autônoma curda disputa com o Governo central. A informação dava um novo conteúdo à advertência lançada por Al Nujaifi sobre a intenção dos novos rebeldes de avançarem sobre Nínive, até a província vizinha de Saladino, onde na sexta-feira passada ocuparam vários bairros durante algumas horas. No dia seguinte, em uma ação mais publicitária do que qualquer outra coisa, eles se apoderaram do campus da Universidade de Al Anbar, em Ramadi, com centenas de estudantes dentro. O Departamento de Estado norte-americano classificou a situação como “extremamente grave” e ofereceu assistência ao Governo iraquiano, com o qual firmou um acordo de cooperação depois da saída das tropas, no fim de 2011. O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, também declarou-se “muito inquieto” devido aos avanços jihadistas. O EIIL é herdeiro do Estado Islâmico do Iraque, o braço da Al Qaeda que, em meados da década passada, combateu a ocupação estadunidense. Durante a guerra civil na Síria, o grupo anunciou no ano passado que começava a operar também naquele país (daí a ampliação de seu nome, em uma referência ao termo histórico para a região), o que causou a reprovação da cúpula da organização-mãe. O Iraque registrou em maio um dos piores números de vítimas da violência, com quase 800 mortos, o que coloca o mês como o de maior violência desde o período de violência sectária registrado entre 2006 e 2007. Segundo o Alto Comissariado da ONU para Refugiados (ACNUR), os combates entre o Exército e os rebeldes já deixaram neste ano, até agora, quase meio milhão de civis desabrigados.

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