segunda-feira, 31 de março de 2014

Golpe de Estado no Brasil em 1964

Golpe Militar de 1964 designa o conjunto de eventos ocorridos em 31 de março de 1964 no Brasil, que culminaram, no dia 1 de abril de 1964, com um golpe de estado que encerrou o governo do presidente João Goulart, também conhecido como Jango. Os militares brasileiros a favor do Golpe costumam designá-lo como Revolução de 1964 ou Contrarrevolução de 1964. Em geral, a expressão é associada a defensores da ditadura. Jango havia sido democraticamente eleito vice-presidente pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) – na mesma eleição que conduziu Jânio da Silva Quadros do Partido Trabalhista Nacional (PTN) à presidência, apoiado pela União Democrática Nacional (UDN). O golpe estabeleceu um regime alinhado politicamente aos Estados Unidos e acarretou profundas modificações na organização política do país, bem como na vida econômica e social. Todos os cinco presidentes militares que se sucederam desde então declararam-se herdeiros e continuadores da Revolução de 1964. O regime militar durou até 1985, quando Tancredo Neves foi eleito, indiretamente, o primeiro presidente civil desde 1964. Jânio renunciou ao mandato no mesmo ano de sua posse (1961), e quem deveria substituí-lo automaticamente e assumir a Presidência era João Goulart, segundo a Constituição vigente à época, promulgada em 1946. Porém este se encontrava em uma viagem diplomática na República Popular da China. Militares então acusaram Jango de ser comunista e o impediram de assumir seu lugar como mandatário no regime presidencialista. Depois de muita negociação, lideradas principalmente pelo cunhado de Jango, Leonel de Moura Brizola, na época governador do Rio Grande do Sul, os apoiadores de Jango e a oposição acabaram fazendo um acordo político pelo qual se criaria o regime parlamentarista, passando então João Goulart a ser chefe-de-Estado. Em 1963, porém, houve um plebiscito, e o povo optou pela volta do regime presidencialista. João Goulart, finalmente, assumiu a presidência da República com amplos poderes, e durante seu governo tornaram-se aparentes vários problemas estruturais na politica brasileira, acumulados nas décadas que precederam o golpe e disputas de natureza internacional, no âmbito da Guerra Fria, que desestabilizaram o seu governo. Em 1964, houve um movimento de reação, por parte de setores conservadores da sociedade brasileira – notadamente as Forças Armadas, o alto clero da Igreja Católica e organizações da sociedade civil, apoiados fortemente pela potência dominante da época, os Estados Unidos – ao temor de que o Brasil viria a se transformar em uma ditadura socialista similar à praticada em Cuba,[carece de fontes] após a falha do Plano Trienal do governo de João Goulart de estabilizar a economia, seguido da acentuação do discurso de medidas vistas como comunistas na época, as quais incluíam a reforma agrária e a reforma urbana. Na época, falar em pobreza, distribuição de renda e saúde significava ser tachado de comunista, mesmo quando não fosse o caso. No dia 13 de março daquele ano, data da realização de comício em frente à Estação Central do Brasil, no Rio de Janeiro, perante trezentas mil pessoas, Jango decreta a nacionalização das refinarias privadas de petróleo e desapropriação, segundo ele para a reforma agrária, de propriedades às margens de ferrovias, rodovias e zonas de irrigação de açudes públicos. Desencadeou-se uma crise no país, com a economia já desordenada e o panorama político confuso. A oposição militar veio à tona para impedir que tais reformas se consolidassem, impondo o que consideravam manutenção da legalidade e da restauração da ordem. Por isso, e pela falta de mobilização das camadas populares da sociedade, a extensa maioria dos críticos do movimento de 1964 qualifica-o como um golpe de estado. Mesmo para uma parte dos militares, a começar pelo ex-presidente Geisel, também é claro que não houve uma revolução, mas um movimento "contra" alguma coisa (corrupção, subversão da ordem, etc.). Para outras lideranças militares, a definição mais adequada para o movimento de 1964 seria a de uma contrarrevolução. O golpe de Estado de 1 de abril teve como desdobramento a instauração do regime militar. Nos anos que se seguiram haverá uma significativa recuperação da economia e taxas de crescimento que chegam a 10% ao ano, constituindo o que se chamou milagre econômico, com entrada significativa de capitais externos, atraídos também pela estabilidade política. O aumento da dívida externa seria um problema a ser enfrentado posteriormente. Paralelamente ao crescimento do PIB, caiu a renda real média do trabalhador brasileiro e com a crise da dívida pública, houve hiper-inflação, que aumentou a desigualdade social no Brasil. Tal desenvolvimento econômico foi acompanhado de censura aos meios de comunicação e de violenta repressão política, especialmente no final da década de 1960 e ao longo dos anos 1970, sob a égide da Lei de Segurança Nacional, justificada pela necessidade de manter a estabilidade política e a segurança interna, no sentido de evitar a influência de ideologias de esquerda, em um mundo dividido pela Guerra Fria. Além da limitação da liberdade de opinião e expressão, de imprensa e organização, naquela época tornaram-se comuns as prisões, os interrogatórios e a tortura daqueles considerados suspeitos de oposição ao regime, comunistas ou simpatizantes, sobretudo estudantes, jornalistas e professores. Para além das prisões, estima-se que cerca de 300 dissidentes perderam a vida. Segundo a versão defendida pelos militares, a maioria dessas mortes teria ocorrido em combate com as Forças Armadas. Entretanto, os grupos de defesa dos direitos humanos e organizações de sobreviventes da ditadura militar, estimam que este número seja muito maior. Este fato inicial foi denominado pelos militares que o executaram, bem como o regime que se sucedeu, como "Revolução de 1964". Mas a noção de que se trataria de uma revolução perdeu parte de sua aceitação pela sociedade brasileira desde meados dos anos 1970, com a abertura democrática então iniciada. Vendo os movimentos de esquerda crescendo e pela influência da propaganda dos movimentos comunistas, foi iniciado um movimento de contra-propaganda conhecido como perigo vermelho , ou perigo comunista . Segundo relatos publicados pelo Departamento de Documentação Histórica da Fundação Getúlio Vargas : (sic)…Os militares envolvidos no golpe de 1964 justificaram sua ação afirmando que o objetivo era restaurar a disciplina e a hierarquia nas Forças Armadas e deter a "ameaça comunista" que, segundo eles, pairava sobre o Brasil. Uma ideia fundamental para os golpistas era que a principal ameaça à ordem capitalista e à segurança do país não viria de fora, através de uma guerra tradicional contra exércitos estrangeiros; ela viria de dentro do próprio país, através de brasileiros que atuariam como "inimigos internos" – para usar uma expressão da época. Esses "inimigos internos" procurariam implantar o comunismo no país pela via revolucionária, através da "subversão" da ordem existente – daí serem chamados pelos militares de "subversivos". Segundo a FGV, havia alguns fatores históricos que posicionavam as Forças Armadas do Brasil contra o comunismo, acentuando a polarização ideológica no Brasil : A percepção de um "perigo comunista" no Brasil passou por um processo de crescente "concretização", até atingir seu clímax com a Revolta de 1935. Assim, após a Revolução Russa de 1917, tiveram lugar no país a criação do Partido Comunista do Brasil (depois Partido Comunista Brasileiro – PCB) em 1922; a conversão do líder tenentista Luís Carlos Prestes ao comunismo, em maio de 1930, e sua ida para a União Soviética, no ano seguinte; e o surgimento, em março de 1935, da Aliança Nacional Libertadora, dominada pelos comunistas. Se em 1917 o comunismo no Brasil era visto ainda como um perigo remoto, "alienígena" e "exótico", aos poucos ele foi se tornando mais próximo. A frustrada revolta comunista de novembro de 1935 foi um evento-chave que desencadeou um processo de institucionalização da ideologia anticomunista no interior das Forças Armadas. Os comunistas brasileiros foram acusados de serem elementos "a serviço de Moscou" e, portanto, traidores da Pátria. Os militares que tomaram parte na revolta foram, em particular, acusados de uma dupla traição: não só do país como da própria instituição militar, ferida em seus dois pilares — a hierarquia e a disciplina. Foram também rotulados de covardes, devido principalmente à acusação, até hoje controversa, de que no levante do Rio teriam assassinado colegas de farda ainda dormindo. O ritual de rememoração dos mortos leais ao governo, repetido a cada ano, tornava seu sacrifício presente, renovava os votos dos militares contra o comunismo e socializava as novas gerações nesse mesmo espírito. Foi no quadro dessa cultura institucional, marcadamente anticomunista, que se viveu a ditadura do Estado Novo e que se formaram os militares que, em 1964, assumiram o poder. A Guerra Fria estava espalhando o temor pelo rápido avanço do chamado, pela extrema direita, "perigo vermelho". As esquerdas espelhavam-se nos regimes socialistas implantados em Cuba, China e União Soviética. O temor ao comunismo influenciou a eclosão de uma série de golpes militares na América Latina, seguidos por ditaduras militares de orientação ideológica à direita, com o suposto aval de sucessivos governos dos Estados Unidos, que consideravam a América Latina como sua área de influência. Fidel Castro vislumbrou expandir sua revolução no Brasil, inicialmente, usando as Ligas Camponesas de Francisco Julião. Posteriormente, propiciou treinamento militar em Cuba para brasileiros selecionados pelas organizações guerrilheiras, capazes de desencadear ações de guerrilha urbana e rural. Cuba e China passaram a financiar grupos de esquerda na América Latina, iniciando um movimento para implantar o comunismo na região, o que de certa forma influenciou na eclosão de uma série de golpes militares apoiados e financiados pelos Estados Unidos, que temiam o avanço comunista no continente. Os EUA não admitiam que os movimentos igualitários e de desenvolvimento regionais fossem contaminados pela doutrina comunista de caráter stalinista ou maoísta. Com a polarização das ideologias houve a eclosão de inúmeros golpes de estado financiados pelos governos americano, soviético e chinês. Guerra Fria A origem da Guerra Fria remonta da rivalidade entre os Estados Unidos e a União Soviética, ocorrida em meados da Segunda Guerra Mundial. Embora muitos afirmem existirem raízes mais profundas provindas do início do século XX, a partir do fim da década de 1940 as desavenças entre os dois blocos acirraram-se, pois ambos afirmavam que os seus sistemas eram os vencedores da guerra que varreu o planeta na época. É sabido que devido aos esforços de guerra, acabaram por surgir as duas superpotências militares, que seguiam ideologias antagônicas, acirrando ainda mais as desavenças em todos os campos do conhecimento, da tecnologia e da cultura. Os comunistas, através de um sistema "socialista autoritário", detinham o poder de seu bloco através de sistemas ditatoriais, enquanto os capitalistas mantinham o poder através do controle econômico, cuja estrutura também financiava ditaduras de direita, que também eram sistemas autoritários. Na América Latina, não eram raros os governos dirigidos por "caudilhos", que poderiam pender para o bloco que bem lhes conviesse. Neste panorama, todos se diziam "democratas". Desta forma, o mundo estava em plena Guerra Fria, a maioria dos países ocidentais se diziam "democráticos" e afirmavam manter a "livre expressão". Dizem alguns[quem?] que existiam algumas exceções às liberdades democráticas como as ditaduras na América Latina. É sabido, porém, que os Estados Unidos aceitavam, financiavam e apoiavam ditaduras da direita em países nos quais acreditavam haver risco de migração para o bloco comunista, como no caso da Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Haiti, Peru, Paraguai, Uruguai etc. Os estudiosos da economia brasileira costumam dividir a economia pós-Segunda Guerra Mundial em dois períodos: o primeiro de 1947 a 1963; e o segundo de 1964 até os dias atuais. Até 1964 a política econômica consistiu na substituição das importações, para estimular a economia doméstica, continuada mesmo com o revezamento de presidentes. Os "Anos JK", por exemplo, deram ampla atenção aos problemas urbanos, como o setor industrial, em detrimento ao rural. Segundo Roger W. Fox, do período de 1961 a 1963, houve problemas como escassez de alimentos, aumentando seus preços, gerando hiperinflação e trazendo a atenção do governo brasileiro ao setor agrícola. Esse conjunto de fatores influenciou de forma considerável a implantação do posterior regime militar. Em 25 de agosto de 1961, o presidente Jânio Quadros pediu renúncia do cargo. O vice-presidente, João Goulart, encontrava-se em viagem à China comunista. Assumiu a presidência o deputado Ranieri Mazzilli, presidente da Câmara dos Deputados. Os militares só aceitaram a posse de João Goulart depois de implantado o parlamentarismo no Brasil. João Goulart assumiu o poder em 7 de setembro de 1961. Em plebiscito realizado em janeiro de 1963, o regime voltou a ser presidencialista, aumentando o poder do presidente João Goulart. Há confrontos abertos entre esquerda e direita no Brasil. No nordeste do Brasil, Francisco Julião organizou lutas camponesas, as Ligas Camponesas. O governador de Pernambuco, Miguel Arraes, tido como comunista, apoiou manifestações de estudantes. João Goulart apoiou a sindicalização de sargentos e foi acusado pelos militares de promover a quebra da hierarquia e da disciplina nas forças armadas. De 28 a 30 de março de 1963, realizou-se em Niterói, na sede do Sindicato dos Operários Navais, um Congresso Continental de Solidariedade a Cuba, com a participação de delegações latino-americanas. Luiz Carlos Prestes manifestou o desejo de que o Brasil fosse a primeira nação da América do Sul a seguir o exemplo de Cuba, tornando-se uma nação comunista. Em outubro de 1963, o ex-governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola organizou o "Grupo dos Onze Companheiros" para tomar o poder pela luta armada. Segundo Brizola, o G-11 seria a "vanguarda avançada do Movimento Revolucionário, a exemplo da Guarda Vermelha da Revolução Socialista de 1917 na União Soviética". No dia 13 de março de 1964, João Goulart assinou, em praça pública, no Rio de Janeiro, decretos de encampação das refinarias de petróleo privadas e autorizou a expropriação de terras, vinte quilômetros à beira de rodovias, ferrovias, rios navegáveis e açudes. Esses decretos de 13 de março e outro comício, no dia 30 de março, no Rio de Janeiro, no Automóvel Clube, foram decisivos para a derrubada de João Goulart: Declara de interêsse social para fins de desapropriação as áreas rurais que ladeiam os eixos rodoviários federais, os leitos das ferrovias nacionais, e as terras beneficiadas ou recuperadas por investimentos exclusivos da União em obras de irrigação, drenagem e açudagem, atualmente inexploradas ou exploradas contrariamente à função social da propriedade, e dá outras providências. —DECRETO Nº 53.700, DE 13 de março de 1964 Declara de utilidade pública, para fins de desapropriação em favor da Petróleo Brasileiro S A - PETROBRÁS, em caráter de urgência, as ações da companhias permissionárias do refino de petróleo. —DECRETO Nº 53.701, DE 13 de MARÇO de 1964 (Decreto da SUPRA) Tabela os aluguéis de imóveis no território nacional, e dá outras providências. —DECRETO Nº 53.702, DE 14 de MARÇO de 196420 O jornal Folha de S. Paulo, no dia 27 de março, escreveu: "Até quando as forças responsáveis deste país, as que encarnam os ideais e os princípios da democracia, assistirão passivamente ao sistemático, obstinado e agora já claramente declarado empenho capitaneado pelo presidente de República de destruir as instituições democráticas?" O Jornal do Brasil, em 31 de março, comentou as atitudes de João Goulart: "Pois não pode mais ter amparo legal quem, no exercício da Presidência da República, violando o Código Penal Militar, comparece a uma reunião de sargentos para pronunciar discurso altamente demagógico e de incitamento à divisão das Forças Armadas." Logo após o discurso do Automóvel Clube, o general Olímpio Mourão Filho, comandante do I Exército, sediado em Juiz de Fora, próximo ao Rio de Janeiro, partiu com suas tropas, sem autorização de outros militares, e iniciou o movimento armado. Durante a eclosão do golpe de 1964 havia duas correntes ideológicas no Brasil, sendo uma de esquerda e outra de direita. Aquelas correntes tinham movimentos populares de ambas facções, acredita-se financiados com capital externo. Além da polarização, existia também um forte sentimento antigetulista, motivador do movimento militar que derrubou Jango. De acordo com Elio Gaspari: "Em 1961, manobrando pelo flanco esquerdo do PCB, Fidel hospedara em Havana o deputado Francisco Julião. Antes desse encontro, com olhar e cabeleira de profeta desarmado, Julião propunha uma reforma agrária convencional. Na volta de Cuba, defendia uma alternativa socialista, carregava o slogan Reforma agrária na lei ou na marra e acreditava na guerrilha como caminho para se chegar a ela. Julião e Prestes estiveram simultaneamente em Havana em 1963. Foram recebidos em separado por Castro. Um já remetera doze militantes para um breve curso de capacitação militar e estava pronto para fazer a revolução. Durante uma viagem a Moscou, teria pedido mil submetralhadoras aos russos. O outro acabara de voltar da União Soviética." No período de 1960 a 1970, 219 guerrilheiros, além de outros não identificados, fizeram treinamento militar em Cuba, alguns ainda no governo Jânio Quadros, poucos no governo Jango e a maioria após 1964. No dia 4 de dezembro de 1962 o jornal O Estado de S. Paulo noticiou a descoberta e desbaratamento de um campo de treinamento de guerrilha em Dianópolis, Goiás (hoje Tocantins), em uma das três fazendas compradas pelo Movimento Revolucionário Tiradentes (MRT) de Julião. Foi decretada a prisão de membros das Ligas Camponesas. No local, foram apreendidos retratos e textos de Fidel Castro, bandeiras cubanas, manuais de instrução de combate, planos de sabotagem e armas, além da contabilidade da ajuda financeira enviada por Cuba e dos planos das Ligas Camponesas em outros estados do País. O responsável por esse centro de treinamento guerrilheiro era Carlos Montarroyo. Vinte e quatro militantes foram presos. Também foram decretadas as prisões de Clodomir dos Santos Morais, Tarzan de Castro e Amaro Luiz de Carvalho. Segundo Denise Rollenberg: "[…] Os documentos do DOPS, o temido Departamento da Ordem Política e Social, encontrados por Denise Rollemberg no Arquivo Público do Rio de Janeiro, atestam que desde 1962 o órgão acompanhava atentamente as estreitas relações de Cuba com as Ligas. A papelada registra também cursos preparatórios de guerrilha em vários pontos do País. O apoio cubano concretizou-se no fornecimento de armas e dinheiro, além da compra de fazendas em Goías, Acre, Bahia e Pernambuco para funcionar como campos de treinamento O golpe não foi algo repentino, ele foi amadurecendo aos poucos. O motivo alegado era o comunismo. O contexto, porém, era bem mais complexo: a estatização promovida por Jango e as visões conflitantes entre a política e a economia de ambas as correntes de pensamento, particularmente da extrema direita e extrema esquerda, vinham se contrapondo desde o início do século XX, sendo as alternativas mistas ainda em estágio embrionário. O golpe militar de 1964 começou a ocorrer dez anos antes, em 1954. Um movimento político-militar conservador descontente com Getúlio Vargas, com sua condição de ex-ditador e com denúncias de corrupção, aliado aos Estados Unidos, tentou derrubar o então presidente Getúlio Vargas, que abafou o golpe terminando com sua própria vida num suicídio. A repercussão da carta-testamento de Getúlio Vargas conteve quaisquer movimentações e desestabilizou profundamente a estrutura política do Brasil. Passados o impacto e a comoção social que se seguiram ao suicídio, em 1955, opositores de Vargas tentaram impedir as eleições, sabendo da provável derrota do grupo. Houve assim uma tentativa de golpe, impedida pela ação firme e corajosa do marechal Henrique Batista Duffles Teixeira Lott, que garantiu a eleição e a posterior posse de Juscelino Kubitschek Em 1961, quando Jânio Quadros renunciou, assumiu a presidência o então vice-presidente João Goulart, e houve suposições de um autogolpe fracassado. Goulart era visto como sucessor político de Getúlio Vargas e era, também, cunhado do governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola, que defendia a realização de reformas de base no Brasil, incluindo a reforma agrária e a reforma urbana. As reformas de base desagradavam os setores conservadores, a classe média, e dirigentes de multinacionais, que vendo seus negócios em risco no Brasil financiaram em 1961 a criação do IPES. E através de seu poderio político financeiro e de lobby no Congresso Nacional acabaram por se movimentar no sentido de impedir a posse de Jango.4 Por influência de grupos mais moderados, houve um acordo político estabelecendo o regime parlamentarista, o que significaria que Goulart seria chefe de estado, mas não chefe de governo — desta forma permaneceria no governo, mas teria poderes reduzidos. Jango chegou ao poder através de uma eleição que levou Jânio Quadros à presidência pela UDN e o próprio João Goulart à vice-presidência pelo PTB. Ou seja presidente e vice-presidente eram inimigos políticos. Esta situação foi possível devido a uma legislação eleitoral que permitia que se votasse no presidente de uma chapa e no vice-presidente de outra. Devido às forças políticas atuantes no país, em 1962, foi convocado um plebiscito para escolher qual a forma de governo o Brasil adotaria: ou retornava ao presidencialismo ou permanecia no parlamentarismo. O povo optou maciçamente pelo presidencialismo, com 9,5 milhões de votos contra dois milhões dados ao parlamentarismo. Goulart começou a governar tentando conciliar os interesses do seu governo com os interesses políticos dos mais conservadores e também dos políticos progressistas no Congresso Nacional. Devido a boicotes de ambas as correntes, houve uma grande demora em implantar as reformas de base. Os setores mais à esquerda, inclusive dentro do próprio PTB, afastaram-se da base governista e iniciaram protestos reivindicativos. Houve um aumento de preços dos mais diversos produtos e serviços. Desta maneira, a inflação acelerou e as medidas econômicas do governo foram duramente atacadas pelos grupos mais à esquerda. Estes viam nas medidas apenas a continuação de uma política antiquada que eles mesmos combatiam. Iniciaram-se greves comandadas pela CGT, o que repercutia mal nos setores patronais. Em 4 outubro de 1963 Goulart solicita o estado de sítio ao Congresso Nacional pelo prazo de 30 dias. A justificativa do Ministério da Justiça era que o governo necessitaria de poderes especiais para impedir a comoção de "guerra civil" que punha em perigo as instituições democráticas. A manobra foi repelida inclusive pela esquerda, e a iniciativa foi vista como uma tentativa de golpe por parte de Jango. Houve também uma importante guinada em direção a reformas de base de inspiração socialista. Junta-se à tensão política a pressão do declínio econômico. A revolta dos marinheiros foi um motim dos marinheiros da Marinha do Brasil ocorrido em 25 de março de 1964. Constituiu-se em uma assembleia de mais de dois mil marinheiros de baixa patente (marinheiros e taifeiros), realizada no prédio do Sindicato dos Metalúrgicos, no Rio de Janeiro. Os marinheiros exigiam melhores condições para os militares e também pediam apoio às reformas políticas de base propostas pelo presidente João Goulart. A assembleia foi chefiada por José Anselmo dos Santos, mais conhecido como Cabo Anselmo. O então ministro da marinha, Sílvio Mota, ordenou a prisão dos líderes do movimento, enviando um destacamento dos fuzileiros navais, comandados pelo contra-almirante Cândido Aragão. Os fuzileiros, porém, juntaram-se ao movimento. Pouco depois da recusa do comandante Aragão em debelar o movimento, Jango expediu ordens proibindo qualquer invasão da assembleia dos marinheiros e exonerou o ministro Mota. No dia seguinte, 26 de março, o ministro do trabalho Amauri Silva negociou um acordo, e os marinheiros concordaram em deixar o prédio pacificamente. Logo em seguida, os líderes do movimento foram presos por militares, sob a acusação de motim. Horas depois, porém, o presidente anistiou os amotinados, criando um forte constrangimento entre os militares diante da imprensa e da sociedade, o que agravou a crise militar. Logo depois, em 30 de março, véspera do golpe, Goulart compareceu a uma reunião de sargentos, no Automóvel Clube, discursando em prol das reformas pretendidas pelo governo e invocando o apoio das forças armadas. As recentes estatizações feitas por Leonel Brizola nas companhias telefônica e de energia do Rio Grande do Sul, ambas pertencentes a grupos dos EUA, criaram um clima tenso entre Brasil e Estados Unidos. Brizola denunciou um acordo de indenização fraudulenta feito com as companhias dos EUA, antigas proprietárias das estatais recém criadas do Rio Grande do Sul. O ministério caiu e o acordo foi suspenso, desagradando aos Estados Unidos. Paralelamente, havia o movimento dos sargentos ideologicamente ligados ao governador Brizola. Estes pleiteavam o direito de serem eleitos, já que suas posses haviam sido impedidas pelo Supremo Tribunal Federal. O movimento estudantil, de orientação esquerdista, realizava protestos nas ruas. O efeito da organização de sargentos e cabos em grupos políticos não pode ser subestimado em relação ao descontentamento dos militares com o governo de Jango, principalmente pela ligação destes com Brizola, que era cunhado do presidente, pois subvertia a hierarquia militar, um dos preceitos mais importantes e talvez a própria alma das Forças Armadas. Brizola criou o movimento chamado de Grupos dos Onze, que consistia na organização popular em grupos de onze pessoas, para fiscalizar parlamentares e militares (já prevendo tentativas de golpes) e pressionar o governo e o congresso pelas reformas de base Os políticos do PSD, mais conservadores, temendo uma radicalização à esquerda deixam de apoiar o governo. A situação política de Goulart se torna insustentável, pois não tinha apoio total do PTB e nem dos comunistas. Não consegue governar de forma conciliatória. A UDN e o PSD temiam pelo crescimento do PTB, já que Leonel Brizola era o favorito para as eleições presidenciais que aconteceriam em 1965. Criou-se o medo de que Goulart levasse o país a um golpe de estado, com a implantação de um regime político nos moldes de Cuba e China. Era o "perigo comunista", que serviria depois como justificativa para o golpe. O comício de Goulart e Brizola, na Central do Brasil, em 13 de março de 1964, foi a chave para dar início ao golpe. Ficou conhecido como Comício da Central. Brizola e Goulart anunciavam as reformas de base, incluindo um plebiscito pela convocação de nova constituinte, a reforma agrária e a nacionalização das refinarias particulares de petróleo. Jango também criticava o sentimento anticomunista e a utilização dos meios religiosos como instrumentos de oposição ao governo.38 Os políticos da UDN e do PSD acreditavam que Brizola pudesse vencer as eleições presidenciais e que o povo apoiaria o seu projeto. Logo a aliança UDN-Militares-Estados Unidos iniciou sua mobilização definitiva em direção ao golpe. Desde 1961 o IPES estava mobilizando a classe média. Sendo o Brasil de maioria católica, a parcela cristã conservadora foi mobilizada para a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, reunindo centenas de milhares de pessoas. A manifestação foi amplamente coberta pela mídia e provocou o alastramento de um sentimento anticomunista pela sociedade. No Rio, a marcha teve como ponto de partida uma grande concentração entre a igreja da Candelária e o prédio do Ministério da Guerra. Segundo Marcos de Castro, a manifestação teve quase nenhuma participação das camadas pobres da população, tendo a maior parte das pessoas vindo de bairros nobres cariocas. Em São Paulo, quinhentas mil pessoas participaram da Marcha da Família com Deus pela Liberdade, no dia 19 de março de 1964. Os manifestantes foram da Praça da República em direção à Praça da Sé, onde foi realizada uma missa pela "salvação da democracia", celebrada pelo padre Patrick Peyton, conhecido por sua campanha anticomunista, cujo slogan era "A família que reza unida permanece unida”. A marcha teve suporte garantido por Adhemar de Barros, Carlos Lacerda e pela CIA. A finalidade desta era mobilizar a maior quantidade possível de participantes para dar respaldo popular e facilitar aos militares a organização da derrubada de Goulart com o apoio dos políticos e da sociedade organizada. Na época, setores conservadores de outras igrejas também se juntaram ao apoio às cruzadas "anticomunistas". A Igreja Metodista, por exemplo, encontrava-se dividida, com setores simpáticos às reformas de Jango, e outros fortemente alinhados aos movimentos golpistas. Cabe lembrar aqui que, no final de 1968, ocorreu o fechamento da Faculdade de Teologia dessa Igreja, em sintonia com o AI-5.7 Muitos pastores das Igrejas Metodista, Luterana e Presbiteriana foram perseguidos. Alguns afastados da vida eclesiástica e compulsoriamente aposentados. Essas igrejas estavam claramente divididas entre os favoráveis ao golpe e os contrários, ligados às Comunidades Eclesiais de Base.7 A movimentação popular foi financiada pelo IPES.4 Adidos militares franceses ensinaram técnicas de tortura para militares brasileiros e de outros países da América Latina usando táticas utilizadas na Guerra Civil Argelina e na Guerra da Indochina Reunião de Kennedy com Lincoln Gordon Entre 11h55 e 12h20 de 30 de julho de 1962, ocorreu na Casa Branca uma reunião que já apontava a influência que teriam os Estados Unidos no golpe que viria a ocorrer no Brasil dois anos mais tarde. Na presença do subsecretário de Estado para Assuntos Interamericanos, Richard Goodwin, do assessor especial para Assuntos de Segurança Nacional, McGeorge Bundy, e do embaixador americano no Brasil, Lincoln Gordon, que tinha ido a Washington relatar a John Kennedy a conversa pessoal que havia tido com o presidente João Goulart, no dia 23 de julho de 1962, em Brasília, Kennedy instruiu Gordon a interferir ativamente na política interna brasileira. Cquote1.svg (Kennedy): - Então, o que vamos fazer ? Eu digo, quem vamos escolher? Nós temos que mandar para lá alguém que possa estabelecer ligações muito rápidas... e tem de falar em português. (Goodwin): - Por que não falamos com o Ros Gilpatric ou alguém... (Kennedy): - Ótimo, mas isto tem de ser feito hoje. (Quinze segundos suprimidos como documento classificado.) Cquote2.svg — John Kennedy, Lincoln Gordon, Richard Goodwin O presidente norte-americano John Kennedy, através do intervencionismo político no Brasil, ordenou o financiamento das campanhas. Segundo o ex-agente da CIA, Philip Agee, os fundos provenientes de fontes estrangeiras foram utilizados na campanha de oito candidatos aos governos dos onze estados onde houve eleições . Houve também o apoio a quinze candidatos ao Senado, a 250 candidatos à Câmara e a mais de quinhentos candidatos às Assembleias Legislativas. Foram feitas doações através do IBAD. Como a bancada de esquerda aumentou, as doações de campanha resultaram numa CPI, que apurou sua procedência. Veio através dos bancos Royal Bank of Canada, Bank of Boston e First National City Bank. Os militares brasileiros, com respaldo político e econômico das forças da UDN, lideradas por Carlos Lacerda, passaram a modelar um movimento para remover Jango do poder. Lacerda havia pedido uma intervenção dos EUA na política brasileira, conforme entrevista ao correspondente no Brasil do jornal Los Angeles Times, Julien Hart. Sua atitude causou uma crise política com os ministros militares solicitando o estado de sítio e a prisão de Lacerda. O estado de sítio foi recusado pelo congresso, com a esquerda suspeitando que fosse uma armadilha dos militares para prender os líderes de esquerda, como Brizola e Miguel Arraes. Como os arquivos do governo de Lyndon Johnson, abertos vinte anos mais tarde, comprovariam, durante o Golpe militar Brasileiro foi feita uma operação militar chamada Operação Brother Sam para atuar no Brasil em apoio à Operação Popeye dos militares. "Somente no ano de 1962, quase cinco mil cidadãos americanos entraram no Brasil, número muito superior à média histórica conforme estudo de Jorge Ferreira." Ainda: (sic) "…o deputado José Joffily, do partido Social-Democrático (PSD), denunciou a 'penetration' e, no princípio de 1963, o jornalista José Frejat, através de O Semanário, revelou que mais de cinco mil militares norte-americanos, 'fantasiados de civis', desenvolviam, no Nordeste, intenso trabalho de espionagem e desagregação do Brasil, para dividir o território nacional…" Darcy Ribeiro citou ainda que "foi desencadeado com forte contingente armado, postado no Porto de Vitória, com instruções de marchar sobre Belo Horizonte". A "Brother Sam" objetivava abastecer com combustível e armas os militares golpistas. O porta-aviões americano USS Forrestal (CVA-59) e destróieres foram enviados à costa brasileira e ficaram próximos do Porto de Vitória (ES) e serviriam de apoio militar às tropas golpistas caso tropas legalistas decidissem resistir ao golpe. Nos telegramas abertos pelos arquivos de segurança nacional americanos, Gordon também reconhece envolvimento americano em "operações secretas de manifestações de rua pró-democracia …e encorajamento [de] sentimento democrático e anticomunista no Congresso, nas Forças Armadas, grupos de estudantes e trabalhadores pró-americanos, igreja, e empresas" e que ele "pode pedir fundos adicionais modestos para outros programas de ações secretas em um futuro próximo". Apesar de parte dos arquivos operacionais da CIA permanecem confidenciais, impedindo os historiadores de medir precisamente o envolvimento direto da CIA no golpe , um documento datado de 30 de março de 1964 revela que a CIA, com base em informações colhidas em Minas Gerais, previa o golpe em poucos dias, falando que "a revolução não será resolvida rapidamente" e "será sangrenta" Jango seguia a tradição do nacionalismo trabalhista de Getúlio Vargas, que havia sido de seu partido, o PTB, cujos críticos acusavam de ser de natureza populista, além de ter influência de centro-esquerda. Os militares, alguns treinados na Escola das Américas, defendiam a ideologia reacionária anticomunista da segurança nacional desenvolvida no centro estratégico das Forças Armadas Brasileiras no Rio de Janeiro, a Escola Superior de Guerra, cuja orientação filosófica seguia a política do National War College desde o final da Segunda Guerra Mundial e início da Guerra Fria. No dia 28 de março de 1964, na cidade de Juiz de Fora, os generais Olímpio Mourão Filho e Odílio Denys se reuniram com o governador de Minas Gerais, o banqueiro Magalhães Pinto. Pinto foi um dos principais financiadores do IPES. A finalidade da reunião era o estabelecimento de uma data para o início da mobilização que culminaria com o golpe militar de 1964. A data estabelecida para o início das operações militares para o golpe foi o dia 4 de abril de 1964. Conforme descrito pelos jornais O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo54 , o general Carlos Guedes, da Infantaria, afirmou que não poderia ser dado o golpe na data planejada, pois "nada que se faz em lua de quarto minguante dá certo". Consta que os golpistas haviam combinado em postergar a mobilização para depois do dia 8 de abril de 1964. Em 31 de março de 1964 o general Olímpio Mourão Filho resolveu intempestivamente partir com suas tropas para o Rio de Janeiro às três horas da manhã. Este ato, segundo os jornais, foi considerado impulsivo pelo marechal Humberto de Alencar Castello Branco.10 Castello Branco, ao saber da partida de Olímpio Mourão Filho, telefonou para Magalhães Pinto com o intuito de segurar o levante. Consta que o Marechal considerava o movimento prematuro e intempestivo. Pinto argumentou que uma vez iniciado o desenlace, seria um erro parar, pois alertaria as forças legalistas, podendo agravar a situação. Anos mais tarde o deputado Armando Falcão perguntou ao general Olímpio Mourão Filho o porquê da atitude precipitada. A resposta do militar divulgada pela imprensa foi: "Em matéria de política, sou uma vaca fardada." Segundo analistas, a precipitação foi um ato temerário de falta de visão estratégica que foi largamente discutido por historiadores e pela imprensa no sentido de que se houvesse reação poderia ter causado uma guerra civil no Brasil. Para tal bastaria que Goulart tivesse uma parcela de apoio de outros segmentos das Forças Armadas leais à Constituição Brasileira, entre elas o general Armando de Moraes Âncora. Antes do regime militar do Brasil, jornais como O Globo, Jornal do Brasil, Correio da Manhã e Diário de Notícias pregaram abertamente a deposição do presidente. Poucos jornais se opuseram ao golpe, destacando-se entre eles o Última Hora, o Diário Carioca e O Semanário. Em 31 de março, a maioria da imprensa apoiava o fim do governo João Goulart: "Seria rematada loucura continuarem as forças democráticas desunidas e inoperantes, enquanto os inimigos do regime vão, paulatinamente, fazendo ruir tudo aquilo que os impede de atingir o poder. Como dissemos muitas vezes, a democracia não deve ser um regime suicida, que dê aos seus adversários o direito de trucidá-la, para não incorrer no risco de ferir uma legalidade que seus adversários são os primeiros a desrespeitar." ― O Globo de 31 de março de 1964. "(…) Além de que os lamentáveis acontecimentos foram o resultado de um plano executado com perfeição e dirigido por um grupo já identificado pela Nação Brasileira como interessado na subversão geral do País, com características nitidamente comunistas." ― Correio do Povo de 31 de março de 1964. "O Exército e os desmandos do Presidente. "Se a rebelião dos sargentos da Aeronáutica fora suficiente para anular praticamente a eficiência da Arma, a subversão da ordem na Marinha assumia as dimensões de um verdadeiro desastre nacional." ― O Estado de S. Paulo de 31 de março de 1964. "Aquilo que os inimigos externos nunca conseguiram começa a ser alcançado por elementos que atuam internamente, ou seja, dentro do próprio País. Deve-se reconhecer, hoje, que a Marinha como força organizada não existe mais. E há um trabalho pertinaz para fazer a mesma coisa com os outros dois ramos das Forças Armadas." ― Folha de S. Paulo de 31 de março de 1964. "Basta! Não é possível continuar neste caos em todos os setores. Tanto no lado administrativo como no lado econômico e financeiro." ― Correio da Manhã de 31 de março de 1964. "É cedo para falar dos programas administrativos, da Revolução. Mas é incontestável que um clima de ordem substituiu o que dominava o País, onde nem mesmo nas Forças Armadas se mantinham nos princípios de rígida disciplina hierárquica que as caracterizam." ― Folha de S. Paulo de 31 de março de 1964. Segundo o jornalista Fernando Molica, "a grande maioria dos jornais era favorável à derrubada do governo João Goulart e festejou o golpe". Segundo Mino Carta, "a Folha de S. Paulo não só nunca foi censurada, como emprestava a sua C-14 (popular Chevrolet Veraneio), usada para transportar o jornal, para recolher torturados ou pessoas que iriam ser torturadas na Oban, Operação Bandeirante". Em seguida à marcha de Olímpio Mourão Filho, o general Âncora havia recebido ordem de João Goulart para prender Castello Branco, porém não a cumpriu. Comandando o Destacamento Sampaio para interceptar o Destacamento Tiradentes, comandado pelo general Murici, o general Âncora, embora com tropa muito mais poderosa e armada não entrou em confronto com os militares que vinham de São Paulo. Ao chegar na Região de Resende, deparou-se com cadetes da Academia Militar das Agulhas Negras em posição defensiva, visando retardar o deslocamento das tropas vindas do Rio. O general Âncora, vendo o futuro da oficialidade do Exército à sua frente, segundo suas palavras "não quis derramamento de sangue brasileiro atirando contra a juventude do país". Se as forças se enfrentassem no Vale do Paraíba, onde se encontraram, poderia se iniciar uma guerra civil, o que, segundo os cronistas da imprensa, os militares não queriam. O Segundo Exército era comandado pelo general Amauri Kruel, que, em contato telefônico com o presidente, recebeu um pedido de apoio para pôr fim ao avanço. Kruel impôs a condição do fechamento do CGT e a prisão de seus dirigentes para apoiar Jango, no que teve a negativa do governante. Então suas tropas se dirigiram para o Rio de Janeiro pela Via Dutra, onde foram interceptadas pelo general Emílio Garrastazu Médici, que estava com os cadetes das Agulhas Negras à sua frente. No dia 1 de abril de 1964 houve uma reunião entre Âncora e Kruel, que, convencidos por Médici, se uniram de fato aos demais militares. Durante as negociações, foi decidida a união das tropas. Enquanto isto, no Nordeste, Miguel Arraes, governador de Pernambuco, e Seixas Dória, governador de Sergipe, foram presos como traidores da nação. O Quarto Exército comandado pelo General Justino Bastos dominava estrategicamente toda a situação, e João Goulart havia voado para Brasília para procurar apoio do Congresso. Na Guanabara, Carlos Lacerda havia posto a polícia à caça de colaboradores de Goulart bloqueando ruas e acessos com caminhões de lixo. As tropas da polícia de Lacerda chegaram a cercar o palácio Guanabara, numa tentativa de prender o Presidente da República. Enquanto era perseguido pelos golpistas, Goulart reuniu-se com o general Nicolau Fico, comandante militar de Brasília, e o general Assis Brasil, chefe da Casa Militar. Preparou um comunicado à nação, informando que iria para o Rio Grande do Sul para se unir às forças do III Exército, sob o comando do general Ladário Teles, informando sobre o golpe e conclamando a população a lutar pela legalidade. Darcy Ribeiro e Waldir Pires falaram à população pela televisão. O governo ainda controlava os meios de comunicação em Brasília. O presidente tentou viajar para Porto Alegre em avião de carreira, porém a decolagem foi sabotada por golpistas. Jango voou então no avião presidencial, arriscando-se a ser abatido por militares. Apesar do acordo com o general Nicolau Fico estabelecer que as tropas ficariam nos quartéis em Brasília, os militares ocuparam as imediações do Congresso para impedir manifestações populares. Estas estavam previstas se os congressistas se reunissem para votar o impedimento do presidente. O motivo seria o fato do chefe da nação ter se ausentado do país. Darcy Ribeiro fez então um comunicado, lido por Doutel de Andrade na tribuna do Congresso Nacional, já na madrugada do dia 2 de abril. O senador Auro Soares de Moura Andrade, presidente do Congresso Nacional, apesar de o presidente da República estar no país, declarou vaga a presidência. Alegou que o presidente havia saído do Brasil e que o comunicado de Darcy Ribeiro era mentiroso. Andrade empossou o presidente da Câmara Ranieri Mazzilli como governante provisório, ato considerado anos depois por juristas como irregular.[carece de fontes] Em seguida mandou desligar os microfones e as luzes rapidamente, sob protestos de Tancredo Neves. Os participantes do Congresso Brasileiro criaram assim condições para o golpe militar e a ditadura que se seguiria. Consta que Darcy Ribeiro tentou convencer o presidente a resistir. Darcy considerava que o governo deveria resistir usando a aviação, comandada pelo brigadeiro Teixeira, para conter as tropas de Olímpio Mourão Filho, composta de recrutas desarmados, e os fuzileiros, comandados pelo contra-almirante Aragão, que poderiam então prender Carlos Lacerda e Castello Branco. Goulart se recusou a resistir pois fora informado que os golpistas tinham o apoio da armada americana, que estava se encaminhando para o Brasil, o que poderia conflagrar uma guerra civil. João Goulart tinha o apoio do Terceiro Exército comandado pelo general Ladário Teles, e de Leonel Brizola. Porém decidiu ir embora do Brasil. A partir de então teria surgido uma dura inimizade entre Brizola e João Goulart, que perduraria até 1976. O general Argemiro de Assis Brasil foi figura determinante na fuga de Jango do país durante o golpe, pois protegeu-o e à sua família, guiando-o em segurança para o Uruguai. Ao se apresentar às autoridades que assumiram ao poder, o general foi preso, processado e sua carreira profissional interrompida sendo considerado traidor. Perante o Exército Brasileiro o general Assis Brasil passou a ser considerado morto. O jornal Última Hora e a sede da UNE foram destruídos por militantes de Lacerda, muitas das organizações que apoiavam Jango tiveram seus líderes presos e perseguidos pela ditadura e muitas das organizações que apoiavam Jango tiveram seus líderes perseguidos e presos. À imediata imposição de um estado de exceção, com a suspensão dos direitos civis, seguiu-se a instauração de uma ditadura militar, política e economicamente alinhada aos Estados Unidos - o que, segundo o novo governo, era primordial para a modernização do Brasil. A frase "O que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil" resumia uma espécie de doutrina vigente. O movimento político militar de 1964 foi um golpe de estado, portanto não somente militar. O Congresso e a sociedade civil tiveram sua parcela de responsabilidade aceitando o patrocínio financeiro e logístico dos Estados Unidos. A "Operação Brother Sam", conforme amplamente divulgado pela própria imprensa nacional e estrangeira, teve papel importante em respaldar a "Operação Popeye", deflagrada por Olímpio Mourão Filho. O National Security Archive, entidade de pesquisa e divulgação de documentos secretos do governo norte-americano, por ocasião dos quarenta anos do golpe militar, divulgou documentos (em domínio público) do primeiro escalão do governo norte-americano da época. Segundo os arquivos, para o presidente Lyndon Johnson o que estava em jogo era o confronto global entre o comunismo soviético e a democracia. Por essa razão Johnson estava disposto a fazer o que fosse preciso para ajudar o movimento que derrubou João Goulart. A embaixada e os consulados norte-americanos no Brasil tinham agentes da CIA encarregados de levantar informações sobre as atividades de comunistas e militares no Brasil. Segundo matéria da revista Veja, em sua edição 1 848, de 7 de abril de 2004, "os militares e empresários que conspiravam contra Jango tinham o hábito de pedir apoio aos americanos para suas aspirações golpistas, revela um relatório de Lincoln Gordon de 27 de março de 1964. (…) Uma nova leva de papéis foi publicada na semana passada no site do National Security Archive". A quebra da hierarquia Uma justificativa apresentada à opinião pública pelos militares após a revolução era a de que este era um movimento político militar para derrubar Jango e restabelecer a hierarquia militar vertical abalada nas Forças Armadas, pelo apoio do presidente da República à luta emancipatória dos sargentos e marinheiros, que queriam candidatar-se a cargos públicos. Este era "ato considerado irregular pela própria legislação e pela Constituição vigente". Também afirmavam que queriam evitar a contaminação das doutrinas de esquerda no Brasil pelos chineses, cubanos e soviéticos. Afirmavam ainda que a finalidade do golpe foi também controlar a inflação e colocar o país "nos eixos". O golpe de 1964 se transformou numa sucessão de atos institucionais, mas também de construções de grandes obras. A modernização elevou o país como uma das grandes economias mundiais. As dívidas geradas pelas famosas "obras faraônicas", ao final da ditadura, geraram uma inflação galopante que levaram o Brasil a um período conhecido posteriormente como "A década perdida".58 As promessas No início houve a promessa à elite, à classe média e à população em geral (noticiada fartamente no rádio, na televisão e na imprensa em geral), que a Constituição de 1946, a normalidade democrática e as eleições seriam preservadas e restabelecidas rapidamente (em 1966, no mais tardar), logo ao final do mandato de Jango, que estaria sendo preenchido pelos interventores militares. Segundo a Fundação Getúlio Vargas: "(sic) …o golpe militar foi saudado por importantes setores da sociedade brasileira. Grande parte do empresariado, da imprensa, dos proprietários rurais, da Igreja católica, vários governadores de estados importantes (como Carlos Lacerda, da Guanabara, Magalhães Pinto, de Minas Gerais, e Ademar de Barros, de São Paulo) e amplos setores de classe média pediram e estimularam a intervenção militar, como forma de pôr fim à ameaça de esquerdização do governo e de controlar a crise econômica." No pensamento vigente da época, o Brasil estava perdido em greves, "baderna", corrupção, "roubalheira" e inflação, portanto haveria que ser feito algo urgente para restabelecer uma suposta ordem democrática. A propaganda institucional (ver IPES) era farta. A sociedade estava dividida pela ideologia. É alegado que qualquer que fosse a direção tomada, fatalmente o Brasil seria uma ditadura, ou de esquerda, ao estilo soviético, chinês, ou cubano, ou de direita, como tantas outras que floresceram na América Latina. Assim, houve a ditadura de direita, alinhando-se ao bloco liderado e financiado pelos Estados Unidos. Logo após o golpe de 1964, em seus primeiros 4 anos, a ditadura foi endurecendo e fechando o regime aos poucos. Vieram os atos institucionais, artificialismos criados para dar legitimidade jurídica a ações políticas contrárias à Constituição Brasileira de 1946, culminando numa ditadura. O período compreendido entre 1968 e 1975 foi determinante para a nomenclatura histórica conhecida como "anos de chumbo". Dezoito milhões de eleitores brasileiros sofreram das restrições impostas por seguidos atos institucionais que ignoravam e cancelavam a validade da Constituição Brasileira, criando um estado de exceção, suspendendo a democracia. Querendo impor um modelo social, político e econômico para o Brasil, a ditadura militar no entanto tentou forjar um ambiente democrático, e não se destacou por um governante definido ou personalista. Durante sua vigência, a ditadura militar não era oficialmente conhecida por este nome, mas pelo nome de "Revolução" e seus governos eram considerados "revolucionários". A visão crítica do regime só começou a ser permitida a partir de 1974, quando o general Ernesto Geisel determinou a abertura lenta e gradual da vida sócio-política do país. O golpe também foi recebido com alívio pelo governo norte-americano, satisfeito de ver que o Brasil não seguia o mesmo caminho de Cuba, onde a guerrilha liderada por Fidel Castro havia conseguido tomar o poder. Os Estados Unidos acompanharam de perto a conspiração e o desenrolar dos acontecimentos, principalmente através de seu embaixador no Brasil, Lincoln Gordon, e do adido militar, Vernon Walters, e haviam decidido, através da secreta "Operação Brother Sam", dar apoio logístico aos militares golpistas, caso estes enfrentassem uma longa resistência por parte de forças leais a Jango. Correntes ideológicas militares Segundo o tenente-coronel de Infantaria e Estado-Maior do Exército Brasileiro Manoel Soriano Neto, em palestra comemorativa proferida na AMAN em 12 de setembro de 1985, em homenagem ao centenário do marechal José Pessoa: "Com as desavenças que grassavam na corrente outubrista, o tenentismo vem a se desintegrar. Tal fato se dá após a Revolução de 1932, mormente durante o ano de 1933, quando se formava a Assembleia Nacional Constituinte. Parcelas das Forças Armadas se desgarraram para a esquerda e para a direita, incorporando-se à Aliança Nacional Libertadora e à Ação Integralista Brasileira, que apregoavam ideologias importadas, não condizentes com a idiossincrasia de nosso povo." Portanto, dentro das forças armadas brasileiras, existia uma grave cisão interna de ordem ideológica e, ainda havia outra divisão entre os moderados e a linha dura. Porém havia também o sentimento patriótico autêntico que manteve ocultas da população todas as desavenças internas. Os grupos concorrentes entre si defendiam pontos de vistas diferentes: Um grupo defendia medidas rápidas diretas e concretas contra os chamados "subversivos" ou "inimigos internos". Estes militares apoiavam sua permanência no poder pelo maior tempo possível. Ao contrário do grupo anterior, o segundo era formado por militares que tinham por doutrina a tradição de intervenções "moderadoras". Estes procuravam permanecer no poder somente o tempo necessário até se formar um governo aceito pelo grupo, a exemplo do que ocorrera em 1930, 1945 e 1954, quando, passado o período de "maior risco institucional", haveria um rápido retorno do poder para os civis. Doutrina da segurança nacional Para os dois grupos era necessário salvaguardar o Brasil contra o poder do comunismo internacional (além do anti-getulismo; leia-se "anti-populismo"). Segundo a doutrina dos militares, o inimigo devia ser extirpado a todo custo e os governos populistas seriam uma porta de entrada para a desordem, subversão e propiciariam a entrada de ideologias nocivas à nação. As facções contrárias internamente nas forças armadas acabaram se unindo apesar da não concordância metodológica. Desta forma, os militares mais radicais se aglutinaram ao general Costa e Silva, e os mais estratégicos ao general Humberto de Alencar Castelo Branco. Muitos militares da época afirmam que se a orientação filosófico-ideológica das forças armadas fosse para a esquerda, estas defenderiam da mesma forma a linha de pensamento, somente o inimigo que mudaria de lado, o que importava era a segurança da Nação. Beneficiados Entre os que apoiariam o golpe militar, havia muitos especuladores de capital, banqueiros, grandes latifundiários, setores da indústria mecânica, construção civil, e principalmente políticos oportunistas que trocavam de partido independente da sua orientação ideológica.59 Os maiores financiadores do golpe foram notadamente as grandes oligarquias do Brasil, além das multinacionais e do próprio governo estadunidense. O IPES, principal órgão de suporte ideológico do golpe, tinha como maiores financiadores seis empresas: Refinaria União, Construtora Rabelo, Light, Cia Docas de Santos, Icomi, Listas Telefônicas Brasileiras, além de trezentas empresas norte-americanas de menor porte. Milagre econômico Ver artigo principal: Milagre brasileiro O surto de crescimento econômico que ocorreu em seguida ao golpe militar, chamado de "Milagre brasileiro", caracterizado pela modernização da indústria e pelas grandes obras, estava de fato ocorrendo. Porém, também havia os interesses de grandes grupos econômicos e a especulação do capital. Estes tinham interesse nos lucros advindos da ditadura forçando a construção de grandes obras de infra-estrutura. Naquela época, fortunas gigantescas foram ganhas às custas de empréstimos externos. Dizem alguns[quem?] que o retorno do investimento das empresas e grupos multinacionais era necessário, o montante aplicado no golpe foi imenso. O problema não equacionado foi o custo social do retorno. O Brasil cresceu, sendo elevado à oitava economia do planeta, mas endividou-se exponencialmente. Ao primeiro sinal de crise, entre 1973 e 1974, o capital especulativo volátil se foi para outras praças mais seguras, deixando o país num beco sem saída. Os empréstimos a juro barato se extinguiram, o crescimento desacelerou, o país entrou em grandes dificuldades de caixa e principalmente de liquidez. Muitas obras pararam ou tiveram sua qualidade diminuída em função da falta de dinheiro para um término adequado, outras foram inauguradas às pressas. A aceleração inflacionária começou lenta, gradual e constante. A economia de aproximadamente 67% da massa populacional (em torno de 40 milhões de pessoas) teve uma redução abrupta, o povo empobreceu e se endividou rapidamente junto ao sistema financeiro, o que gerou escassez de capital e aumentou a impressão de papel-moeda, que realimentou a inflação, que por sua vez alimentou a escassez. A pressão social foi aumentando exponencialmente, e todos começavam a maldizer o governo, inclusive os próprios servidores públicos, apesar de isso ser proibido. O governo militar, prevendo onde isso poderia chegar, viu-se forçado a mudar de estratégia. Já em meados de 1976, iniciou um lento processo de abertura democrática e adequação social. Este processo não poderia ser rápido demais, pois poderia haver uma explosão social, nem muito lento, pois a recessão advinda poderia destruir a economia do país. Ato Institucional Número Um Em 9 de abril de 1964 foi publicado o Ato Institucional Número Um, ou AI-1, que suspendeu por dez anos os direitos políticos de todos aqueles que poderiam ser contrários ao regime, intimidando os congressistas com a ameaça de cassações, prisão, enquadramento como subversivos e expulsão do país. A Lei de Segurança Nacional, que seria publicada em 3 de março de 1967, teve seu embrião no AI-1. O primeiro paragrafo do AI-1, conforme já observado, mostra a preocupação de legitimar imediatamente o novo regime: "…É indispensável fixar o conceito do movimento civil e militar que acaba de abrir ao Brasil uma nova perspectiva sobre o seu futuro. O que houve e continuará a haver neste momento, não só no espírito e no comportamento das classes armadas, como na opinião pública nacional, é uma autêntica revolução… A revolução se distingue de outros movimentos armados pelo fato de que nela se traduz não o interesse e a vontade de um grupo, mas o interesse e a vontade da Nação… A revolução vitoriosa se investe no exercício do Poder Constituinte. Este se manifesta pela eleição popular ou pela revolução. Esta é a forma mais expressiva e mais radical do Poder Constituinte. Assim, a revolução vitoriosa, como Poder Constituinte, se legitima por si mesma."

domingo, 30 de março de 2014

REVOLUÇÃO DE 1964 - A Verdade Sufocada

No dia 31 de março próximo faz 40 anos que foi deposto o Presidente da República, João Goulart. Uns chamam esse acontecimento de golpe militar, outros de tomada do poder, alguns outros de Revolução de 1964. Eu prefiro considerá-lo como a Contra-Revolução de 31 de março de 1964. Vou lhes explicar o meu ponto de vista ao longo deste artigo. Espero que ao final vocês tenham dados suficientes para julgar se estou certo. Vocês foram cansativamente informados por seus professores, jornais, rádios, TV e partidos políticos : - que os militares tomaram o poder dos civis para impedir que reformas moralizantes fossem feitas; -que para combater os "generais que usurparam o poder" os jovens da época uniram-se e lutaram contra a ditadura militar e que muitos deles morreram, foram mutilados, presos e torturados na luta pela "redemocratização" do país; - que os militares assim agiram a mando dos Estados Unidos, que temiam o comunismo instalado no Brasil; -que jovens estudantes, idealistas, embrenharam-se nas matas do Araguaia para lutar contra a ditadura e pela redemocratização do país. Com quantas inverdades fizeram a cabeça de vocês! E por que essas mentiras são repetidas até hoje? Foi a maneira que eles encontraram para tentar justificar a sua luta para implantar um regime do modelo soviético, cubano ou chinês no Brasil. Por intermédio da mentira, eles deturparam a História e conseguiram o seu intento. Vocês que não viveram essa época acreditam piamente no que eles dizem e se revoltam contra os militares. Vamos aos fatos, pois eu vivi e participei dessa época. Em março de 1964 eu era capitão e comandava uma bateria de canhões anti-aéreos do 1º Grupo de Artilharia Anti-Aérea, em Deodoro, no Rio de Janeiro. A maioria dos oficiais que servia no 1º Grupo de Artilharia AAe, entre eles eu, teve uma atitude firme para que o Grupo aderisse à Contra-Revolução. Eu era um jovem com 31 anos. O país vivia no caos. Greves políticas paralizavam tudo: transportes, escolas, bancos, colégios. Filas eram feitas para as compras de alimentos. A indisciplina nas Forças Armadas era incentivada pelo governo. Revolta dos marinheiros no Rio; revolta dos sargentos em Brasília. Na minha bateria de artilharia havia um sargento que se ausentava do quartel para fazer propaganda do Partido Comunista, numa kombi, na Central do Brasil. Isto tudo ocorria porque o governo João Goulart queria implantar as suas reformas de base à revelia do Congresso Nacional. Pensava, por meio de um ato de força, em fechar o Congresso Nacional com o apoio dos militares "legalistas". Vocês devem estar imaginando que estou exagerando para lhes mostrar que a Contra-Revolução era imperativa naqueles dias. Para não me alongar, vou citar o que dizem dois conhecidos comunistas: - depoimento de Pedro Lobo de Oliveira no livro "A esquerda armada no Brasil" - "muito antes de 1964 já participava na luta revolucionária no Brasil na medida de minhas forças. Creio que desde 1957. Ou melhor, desde 1955". "Naquela altura o povo começava a contar com a orientação do Partido Comunista". - Jacob Gorender - do PCBR, escreveu no seu livro "Combate nas Trevas": "Nos primeiros meses de 1964, esboçou-se uma situação pré-revolucionária e o golpe direitista se definiu, por isso mesmo, pelo caráter contra-revolucionário preventivo. A classe dominante e o imperialismo tinham sobradas razões para agir antes que o caldo entornasse". Diariamente eu lia os jornais da época: O Dia, O Globo, Jornal do Brasil, Tribuna da Imprensa, Diário de Notícias, etc... Todos eram unânimes em condenar o governo João Goulart e pediam a sua saída, em nome da manutenção da democracia. Apelavam para o bom senso dos militares e até imploravam a sua intervenção, para que o Brasil não se tornasse mais uma nação comunista. Eu assistia a tudo aquilo com apreensão. Seria correto agirmos para a queda do governo? Comprei uma Constituição do Brasil e a lia seguidamente. A minha conclusão foi de que os militares estavam certos ao se antecipar ao golpe de Jango. Às Forças Armadas cabe zelar para a manutenção da lei, da ordem e evitar o caos. Nós não tinhamos que defender o governo; tinhamos que defender a nação. O povo foi às ruas com as Marchas da Família com Deus pela Liberdade, no Rio, São Paulo e outras cidades do país. Todos pedindo o fim do governo João Goulart, antes que fosse tarde demais. E, assim, aconteceu em 31/03/1964 a nossa Contra-Revolução. Os jornais da época(Estado de São Paulo, O Globo, Jornal do Brasil; Tribuna da Imprensa e outros ) publicaram, nos dias 31/03/64 e nos dias seguintes, editoriais e mais editoriais exaltando a atitude dos militares. Os mesmos jornais que hoje combatem a nossa Contra- Revolução. Os comunistas que pleiteavam a tomada do poder não desanimaram e passaram a insuflar os jovens, para que entrassem numa luta fraticida, pensando que lutavam contra a ditadura. E mentiram tão bem que muitos acreditam nisso até hoje. Na verdade, tudo já estava se organizando. Em 1961, em pleno governo Jânio Quadros, Jover Telles, Francisco Julião e Clodomir dos Santos Morais estavam em Cuba acertando cursos de guerrilha e o envio de armas para o Brasil. Logo depois, alguns jovens eram indicados para cursos na China e em Cuba. Bem antes de 1964 a área do Araguaia já estava escolhida pelo PC do B para implantar a guerrilha rural. Em 1961 estávamos em plena democracia. Então para que eles estavam se organizando? Julião já treinava as suas Ligas Camponesas nessa época, que eram muito semelhantes ao MST de hoje. Só que sem a organização, o preparo, os recursos, a formação de quadros e a violenta doutrinação marxista dos atuais integrantes do MST. E foi com essa propaganda mentirosa que eles iludiram muitos jovens e os cooptaram para as suas organizações terroristas. Então, começou a luta armada. Foram vários atos terroristas: o atentado ao aeroporto de Guararapes, em Recife, em 1966; a bomba no Quartel General do Exército em São Paulo, em 1968; o atentado contra o consulado americano; o assassinato do industrial Albert Boilesen e do capitão do Exército dos Estados Unidos Charles Rodney Chandler; seqüestros de embaixadores estrangeiros no Brasil . A violência revolucionária se instalou. Assassinatos, ataques a quartéis e a policiais aconteciam com freqüência. Nessa época, eles introduziram no Brasil a maneira de roubar dinheiro com assaltos a bancos, a carros fortes e a estabelecimentos comerciais. Foram eles os mestres que ensinaram tais táticas aos bandidos de hoje.Tudo treinado nos cursos de guerrilha em Cuba e na China. As polícias civil e militar sofriam pesadas baixas e não conseguiam , sozinhas, impor a lei e a ordem. Acuado, perdendo o controle da situação, o governo decretou o AI-5, pelo qual várias liberdades individuais foram suspensas. Foi um ato arbitário mas necessário. A tênue democracia que vivíamos não se podia deixar destruir. Para combater o terrorismo, o governo criou uma estrutura com a participação dos Centros de Informações da Marinha (CENIMAR), do Exército (CIE) e da Aeronáutica (CISA). Todos atuavam em conjunto, tanto na guerrilha rural quanto na urbana. O Exército, em algumas capitais, criou o seu braço operacional, os Destacamentos de Operações de Informações ( DOI). Para trabalharem nos diversos DOI do Brasil, o Exército seleciononou do seu efetivo alguns majores, capitães e sargentos. Eram, no máximo, 350 militares, entre os 150 mil homens da Exército. Eu era major, estagiário da Escola de Estado Maior. Tinha na época 37 anos e servia no II Exército, em São Paulo. Num determinado dia do ano de 1970, fui chamado ao gabinete do comandante do II Exército, general José Canavarro Pereira, que me deu a seguinte ordem: "Major, o senhor foi designado para comandar o DOI/CODI/II Ex. Vá, assuma e comande com dignidade". A partir desse dia minha vida mudou. O DOI de São Paulo era o maior do país e era nesse Estado que as organizações terroristas estavam mais atuantes. O seu efetivo em pessoal era de 400 homens. Destes, 40 eram do Exército, sendo 10 oficiais, 25 sargentos e 5 cabos. No restante, eram excelentes policiais civis e militares do Estado de São Paulo. Esses foram dias terríveis! Nós recebíamos ameaças freqüentemente. Minha mulher foi de uma coragem e de uma abnegação total. Quando minha filha mais velha completou 3 anos de idade, ela foi para o jardim da infância, sempre acompanhada de seguranças. Minha mulher não tinha coragem de permanecer em casa, enquanto nossa filha estudava. Ela ficava dentro de um carro, na porta da escola, com um revólver na bolsa. Não sómente nós passamos por isso! Essa foi a vida dos militares que foram designados para combater o terrorismo e para que o restante do nosso Exército trabalhasse tranqüilo e em paz. Apreendemos em "aparelhos" os estatutos de, praticamente, todas as organizações terroristas e em todos eles estava escrito, de maneira bem clara, que o objetivo da luta armada urbana e rural era a implantação de um regime comunista em nosso país. Aos poucos o nosso trabalho foi se tornando eficaz e as organizações terroristas foram praticamente extintas, por volta de 1975. Todos os terroristas quando eram interrogados na Justiça alegavam que nada tinham feito e só haviam confessado os seus crimes por terem sido torturados. Tal alegação lhes valia a absolvição no Superior Tribunal Militar. Então, nós passamos a ser os " torturadores". Hoje, como participar de seqüestros, de assaltos e de atos de terrorismo passou a contar pontos positivos para os seus currículos eles, posando de heróis, defensores da democracia, admitem ter participado das ações. Quase todos continuam dizendo que foram torturados e perseguidos politicamente. Com isso recebem indenizações milionárias e ocupam elevados cargos públicos. Nós continuamos a ser seus " torturadores" e somos os verdadeiros perseguidos politicos. As vítimas do terrorismo até hoje não foram indenizadas. O Brasil com toda a sua população e com todo seu tamanho teve, até agora, 120 mortos identificados, que foram assassinados por terroristas, 43 eram civis que estavam em seus locais de trabalho ( estima-se que existam mais cerca de 80 que não foram identificados ); 34 policiais militares; 12 guardas de segurança; 8 militares do Exército; 3 agentes da Polícia Federal; 3 mateiros do Araguaia; 2 militares da Marinha; 2 militares da Aeronáutica; 1 major do Exército da Alemanha; 1 capitão do Exército dos Estados Unidos; 1 marinheiro da Marinha Real da Inglaterra. A mídia fala sempre em "anos de chumbo", luta sangrenta, noticiando inclusive que , só no cemitério de Perus, em São Paulo, existiriam milhares de ossadas de desaparecidos políticos. No entanto o Grupo Tortura Nunca Mais reclama um total de 284 mortos e desaparecidos que integravam as organizações terroristas. Portanto, o Brasil, com sua população e com todo o seu tamanho, teve na luta armada, que durou aproximadamente 10 anos, ao todo 404 mortos. Na Argentina as mortes ultrapassarm 30.000 pessoas; no Chile foram mais de 4.000 e no Uruguai outras 3.000. A Colômbia, que resolveu não endurecer o seu regime democrático, luta até hoje contra o terrorismo. Ela já perdeu mais de 45.000 pessoas e tem 1/3 do seu território dominado pelas FARC. Os comunistas brasileiros são tão capazes quanto os seus irmãos latinos. Por que essa disparidade? Porque no Brasil dotamos o país de leis que permitiram atuar contra o terrorismo e também porque centralizamos nas Forças Armadas o combate à luta armada. Fomos eficientes e isso tem que ser reconhecido. Com a nossa ação impedimos que milhares de pessoas morressem e que esta luta se prorrogasse como no Peru e na Colômbia. No entanto, algumas pessoas que jamais viram um terrorista, mesmo de longe, ou preso, que jamais arriscaram as suas vidas, nem as de suas famílias, criticam nosso trabalho. O mesmo grupo que só conheceu a luta armada por documentos lidos em salas atapetadas e climatizadas afirma que a maneira como trabalhamos foi um erro, pois a vitória poderia ser alcançada de outras formas. Já se declarou, inclusive, que: " a ação militar naquele período não foi institucional. Alguns militares participaram, não as Forças Armadas. Foi uma ação paralela". Alguns também nos condenam afirmando que, como os chefes daquela época não estavam acostumados com esse tipo de guerra irregular, não possuíam nenhuma experiência. Assim, nossos chefes, no lugar de nos darem ordens, estavam aprendendo conosco, que estávamos envolvidos no combate. Segundo eles, nós nos aproveitávamos dessa situação para conduzir as ações do nosso modo e que, no afã da vitória, exorbitávamos . Mas as coisas não se passavam assim . Nós que fomos mandados para a frente de combate nos DOI, assim como os generais que nos chefiavam, também não tínhamos experiência nenhuma. Tudo o que os DOI faziam ou deixavam de fazer era do conhecimento dos seus chefes. Os erros existiram, devido à nossa inexperiência, mas os nossos chefes eram tão responsáveis como nós. Acontece que o nosso Exército há muito tempo não era empregado em ação. Estava desacostumado com a conduta do combate, onde as pessoas em operações têm que tomar decisões, e decisões rápidas, porque a vida de seus subordinados ou a vida de algum cidadão pode estar em perigo. Sempre procurei comandar liderando os meus subordinados. Comandei com firmeza e com humanidade, não deixando que excessos fossem cometidos. Procurei respeitar os direitos humanos, mas sempre respeitando, em primeiro lugar, os direitos humanos das vítimas e, depois, os dos bandidos. Como escrevi em meu livro "Rompendo o Silêncio ", terrorismo não se combate com flores. A nossa maneira de agir mostrou que estávamos certos, porque evitou o sacrifício de milhares de vítimas, como aconteceu com os nossos vizinhos. Só quem estava lá, frente a frente com o terroristas, dia e noite, de arma na mão, pode nos julgar. Finalmente, quero lhes afirmar que a nossa luta foi para preservar a democracia. Se o regime implantado pela Contra -Revolução durou mais tempo do que se esperava, deve-se, principalmente, aos atos insanos dos terroristas. Creio que, em parte, esse longo período de exceção deveu-se ao fato de que era preciso manter a ordem no país. Se não tivéssemos vencido a luta armada, hoje estaríamos vivendo sob o tacão de um ditador vitalício como Fidel Castro e milhares de brasileiros teriam sido fuzilados no "paredón" ( em Miami em fevereiro, foi inaugurado por exilados cubanos, um Memorial para 30.000 vítimas da ditadura de Fidel Castro). Hoje temos no poder muitas pessoas que combatemos e que lá chegaram pelo voto popular e esperamos que eles esqueçam os seus propósitos de 40 anos passados e preservem a democracia pela qual tanto lutamos.

As comunidades quilombolas que resistem em Oriximiná


Subindo o rio Trombetas a partir de Oriximiná, ao norte do Pará, se avistam pequenas parcelas de terra cercadas pela mata verde e densa da Amazônia, a maior floresta do Brasil. Cerca de três ou quatro casas de palafita, típicas de zonas alagadas que se sustentam por paus de madeira no alto para evitar a invasão das cheias que ocorrem entre dezembro e maio, ocupam esses pequenos espaços desmatados, que aparecem intermitentemente no curso do rio. Nesses limitados recôncavos vivem comunidades quilombolas, remanescentes da época da escravidão de negros africanos que haviam sido levados à vila portuguesa de Óbidos, fundada em 1697 a 82 quilômetros de Oriximiná, para trabalhar nas plantações de cacau no final do século XIX, como também escravos provenientes de fazendas das cidades de Santarém, Alenquer e na capital do estado, Belém. Hoje essa população de aproximadamente 8.000 pessoas distribuídas em 332.654 hectares enfrenta o avanço da exploração de bauxita em seu território. Os que conseguiram fugir do trabalho forçado no campo subiram o afluente do rio Amazonas em canoas e percorreram uma distância de 223 quilômetros até Cachoeira Porteira, onde se instalaram com o apoio dos índios wai wai e de outras etnias, que já viviam na zona. Protegidos pelas barreiras naturais da selva e das quedas d’água, começaram a formar suas casas à beira do rio, nas partes mais altas e escondidas. Alguns desses escravos eram os avós de Aloízio dos Santos, de 64 anos, um quilombola que vive na comunidade da Tapagem, às margens do rio Trombetas. “Meus avós contam que os índios os acolheram. Meu tio, Raimundo Vieira, nasceu no quilombo Maravilha (um dos maiores do Pará)”. Meus avós contam que os índios os acolheram. Meu tio, Raimundo Vieira, nasceu no quilombo Maravilha (um dos maiores do Pará)” Aloízio dos Santos, quilombola de 64 anos A região do Alto e Baixo Trombetas ficou conhecida como Palmares Amazônico, em referência ao maior quilombo de negros escravos fugidos do país, no estado de Alagoas, nordeste do Brasil, que congregou aproximadamente 20.000 escravos. Hoje os quilombolas do Pará lutam pela titulação dessa área com a ajuda da Comissão Pró-Índio, uma ONG que trabalha com as 35 comunidades da região. “Ninguém teria vindo para cá se não fosse por medo do branco”, afirma Domingos Printes, um quilombola da comunidade do Abuí, referindo-se ao isolamento da área e dificuldades de transporte e comunicação. A população quilombola tem o rio como estrada e os barcos como carros, já que não há acesso por terra. Do rio também tiram o peixe, tomam banho, lavam a louça e a roupa. Não há rede de esgoto nem saneamento e a energia elétrica fica por conta de geradores movidos a combustível, que na região chega a 3,20 reais o litro. Mapa do estado do Pará, onde estão as cidades de Cachoeira Porteira, Oriximiná e Óbidos. Porto Trombetas é o distrito industrial de Oriximiná, onde fica a sede da Mineradora Rio do Norte. / INFOGRAFIA (EL PAÍS) Os celulares não têm cobertura e apenas uma comunidade, Tapagem, possui um orelhão que “funciona só quando não chove”, afirma uma das moradoras da única vila que se assemelha a uma cidade, já que tem uma escola, luz nas ruas de chão batido, e onde as casas estão próximas uma das outras que é possível até mesmo ouvir desde uma delas o DVD pirata tocando Banda Calypso, um dos grupos paraenses do gênero brega. As notícias locais chegam através de barcos e lanchas, onde homens como Domingos, um dos coordenadores da associação das comunidades quilombolas, a ARQMO, se encarregam de avisar os familiares sobre a morte de um parente, se está chegando um carregamento de madeira ou gasolina, ou que no dia seguinte não haverá aula para as crianças. O caminho do aeroporto de Porto Trombetas, uma cidade ao estilo da vila dos outros na série de televisão Lost, até a comunidade do Abuí, leva duas horas em lancha rápida. Pelo rio se veem botos (golfinhos de rio), ariranhas (lontras), aves e incontáveis espécies de árvores e frutas. Há dois postos de fiscalização no trajeto, um do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais renováveis, o Ibama, e outro do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, o ICMBio, onde os quilombolas devem parar obrigatoriamente por tratar-se de uma reserva florestal e, em alguns trechos, da floresta nacional da Amazônia. Em um município onde a incidência da pobreza é de 43,10%, segundo dados do IBGE, a falta de estrutura e de condições mínimas são evidentes e fazem parte da vida dos quilombolas Quando o barulho do motor do barco cessa, as cigarras preenchem o vazio, disputando o volume com o ruído dos macacos. Ao entardecer, mariposas se encarregam de dificultar a visão de quem atravessa o rio e atingem rostos e corpos como chibatadas velozes. Abrir a boca, neste momento, é a mesma sensação que receber um pacote de confetes de papel na língua. A casa de Domingos é uma construção de madeira típica de ribeirinhos, onde vivem 10 pessoas em três cômodos. Em um município onde a incidência da pobreza é de 43,10%, segundo dados do IBGE, a falta de estrutura e de condições mínimas são evidentes e fazem parte da vida dos quilombolas. Na verdade, ela já foi naturalizada. Mas ainda assim é melhor do que as memórias sofridas na época da escravidão. Para Manuel Cordeiro, de 65 anos, conhecido como Seu Canela, as lembranças das histórias de família lhe deixam indignado. “Se o branco queria escrever, colocavam o óleo quente na mão do negro para alumiá (iluminar). Se me mandassem fazer isso eu preferiria morrer. Por isso eles fugiam”, explica. À noite parecia que faltavam lugares para sentar. A sala estava repleta: nem todas as famílias possuem televisão e acabam indo a casa uma das outras para assistir a novela ou o Big Brother, um dos programas mais populares entre os quilombolas. Ainda assim, o futebol é o que tem maior número de espectadores, especialmente se é jogo do Vasco ou Flamengo. Anízia Garcia dos Santos, professora e coordenadora de uma escola municipal que atende as comunidades quilombolas do Abuí e do Paraná. / B.B. Quando o gerador cessa, o escuro volta a preencher todos os cantos, superados apenas pelos vagalumes e a lua, que insiste em aparecer apesar das nuvens. As paredes de madeira rugem com o balançar das redes, a cama onde dorme o quilombola. As placas de lenha não alcançam o teto da casa, o que faz com que todos os cômodos estejam conectados. Ainda que o bloqueio visual funcione em certa medida, considerando que também não há portas, se ouve tudo. O banheiro é na mata e toma-se banho no rio, que tem uma água um pouco amarelada pela folhagem que cai e por estar misturada com a argila do fundo. Dizem que não há mosquitos pelo PH ácido desse trecho do rio Trombetas. Ainda assim, preferem usar essa água “por ser corrente, não parada”, explica Claudiana, mulher de Domingos. Durante o dia os espaços se revelam. Aquela lenha que estava sob a mangueira era na verdade um banco onde o pai de Claudiana, o quilombola Domingos Humberto de Oliveira, de 73 anos, se senta para trabalhar o ambé, um tipo de cipó que serve para tecer o paneiro, uma espécie de mochila cilíndrica usada pelos quilombolas para colher castanha. Oliveira se dedica a fazer paneiros e tipiti, um espremedor de massa de mandioca feito com outro tipo de cipó, a jacitara. Um paneiro custa em média 40 reais e demora três dias para ser feito, porque o ambé, depois de descascado, deve ficar pelo menos 24 horas mergulhado na beira do rio, para facilitar seu manejo e evitar cortes nas mãos do artesão. Seu sonho, disse, “é ter uma casa perto dos recursos, em Orixi, porque aqui a gente tem saúde, mas não tem remédio”, explica Oliveira, que teve um AVC aos 50 anos e ficou oito dias sem falar por falta de assistência médica. Cruz Alta, um dos maiores platôs de bauxita, está dentro do território reivindicado pela população quilombola. A MRN tem previsão de iniciar as explorações em 2022. Oliveira teve três irmãos mortos pela pneumonia, uma doença que ainda mata os quilombolas durante as cheias. Sobre a origem de sua família, Oliveira afirma não ter certeza se seus familiares eram escravos: “só sei que minha mãe era cearense e meu pai de Orixi”. Antes de vir morar no Abuí, Oliveira foi expulso de uma zona onde havia um quilombo inicialmente, o Jacaré, local em que está instalada a base do Ibama hoje. Manuel Raimundo Pereira dos Santos, Seu Tinga, um quilombola de 65 anos, conta que seus parentes também foram expulsos do Jacaré, “com muita violência”, em 1976. “Todos eram descendentes de escravos e ainda haviam alguns vivos naquele tempo, que eram fugidos”, relembra. O avô de Anízia Garcia dos Santos, professora de 40 anos, era um escravo fugitivo, que se instalou acima das cachoeiras, no famoso quilombo Maravilha. Anízia explica que a maioria dos idosos têm vergonha de contar sobre o passado e que por isso não conseguiu obter muitas informações com o avô. “Até porque a escravidão, para eles, ainda existe, desde o ponto de vista da proibição de uma das tradições do quilombola, que era comer tartaruga. A proibição do Ibama, como também a regulamentação do período de colheita da castanha na reserva e a nossa circulação na área do Tabuleiro (Jacaré), onde nossos antepassados viviam, são vistas pelos mais velhos como formas de opressão do branco sobre o negro”, explica. Enquanto Seu Domingos tira os excessos do ambé, uma galinha se aproxima para bicar uma manga que recém caiu do pé. Sua bisneta, Bruna, de dois anos, sai correndo atrás do animal, descalça e nua, como a maioria das crianças que vivem em contato constante com a natureza naquela localidade. Manuel Raimundo Pereira dos Santos, Seu Tinga, quilombola neto de escravos fugidos que mora na comunidade da Tapagem, às margens do rio Trombetas. / B.B. Se na década de 80 os quilombolas se sentiram ameaçados pela chegada do Ibama na região, que lhes expulsou de onde viviam e lhes proibiu de comer tartaruga, se encontram agora encurralados pela exploração da bauxita em seu território. A Mineração Rio do Norte (MRN), um consórcio composto pelos acionistas Vale (40%), Alcoa (18,2%), bhpbilliton (14,8%), RioTintoAlcan (12%), CBA (10%) e Hydro (5%), iniciou os trabalhos na região de Trombetas na década de 70. O primeiro passo foi mapear os platôs onde se concentrava o minério, matéria prima do alumínio. Posteriormente, depois de conseguir algumas licenças e instalar a base em Porto Trombetas, começaram a explorar. Cruz Alta, um dos maiores platôs, fica justamente na área quilombola e tem previsão de iniciar as explorações em 2022. A área é reivindicada pela população quilombola que pede seu direito de titulação da terra, previsto na Constituição de 1988. O processo está em andamento, apenas aguardando a publicação do relatório de identificação do território, já realizado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, o Incra. Pelo tumultuado processo, que envolve os órgãos responsáveis pelo meio ambiente, por tratar-se de uma área que também tem uma parcela de Reserva Florestal e da Floresta Nacional, o ICMBio suspendeu recentemente as atividades da MRN nesta área até que seja realizada a consulta prévia prevista na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). O posicionamento das comunidades é que os estudos não se realizem até que a titulação saia. O óleo de copaíba é vendido a 25 reais o litro e uma árvore pode render até vinte. Enquanto, com a castanha, os quilombolas recebem 40 reais por um caixote de feira cheio delas Clóvis Bastos, gerente de Gestão, Saúde, Meio Ambiente e Relações comunitárias da MRN afirma que “a abertura das trilhas estão suspensas, mas elas já existem, porque foram abertas há mais de 30 anos para a pesquisa”. Os estudos que foram paralisados pela suspensão do ICMBio serviriam para fazer o relatório de impacto ambiental (EIA/RIMA), que posteriormente seria apresentado à consulta popular prevista em lei. No entanto, ainda que a população não esteja de acordo, o subsolo brasileiro é de propriedade do Governo federal. E, para ressarcir a população, o único que poderia ser feito seriam “medidas compensatórias, além do reflorestamento mais próximo da mata original”, conclui Bastos. “A senhora já viu a cor de uma mata reflorestada?”, pergunta indignada e descrente Albenize, esposa de Manuel Francisco Xavier Valério, cabeça de uma família quilombola. Enquanto uma das filhas empunha um facão para abrir as castanhas, sentada sobre uma pedra, Albenize e Manuel dizem que não querem que a mineradora explore o platô de Cruz Alta. O desmatamento é fundamental para a exploração da bauxita, que se encontra no subsolo, em uma terra vermelha que não se distingue do minério de mesma cor. “Se desmatar vai prejudicar o mutum, o inhambu, o jacamim, o jacu...”, lista Albenize as aves da região, que fazem parte da dieta dos quilombolas, assim como porcos, cotias e animais menores obtidos com a caça. Ainda assim, dependem de alguns alimentos básicos da cidade, como o arroz e o óleo de cozinha, que não podem extrair da terra onde habitam “porque o Ibama não deixa a gente desmatar nem um pouquinho, nem para criar gado pra gente comer”, afirma Manuel Francisco. Aloízio dos Santos, de 64 anos, é um quilombola cuja família vive em casas ao redor da sua. Em sua sala, uma das poucas com chão de cimento, conta as memórias dos seus avós, acolhidos pelos índios. / B.B. Além da venda da castanha-do-pará, que no ano passado gerou 4,9 milhões de reais em renda somente no município de Oriximiná, a família de 11 filhos conta com o auxílio da Bolsa Família. “Antes vinha 374 reais, agora recebemos somente 38, por um filho que tem bolsa jovem”, explica Albenize. Apenas um dos filhos, Francilene, terminou o ensino médio. E ela quer fazer engenharia da computação, algo exótico tanto pela escolha quanto pelo desejo de cursar o terceiro grau, algo que a maioria dos quilombolas nem chega a almejar. Apenas os quilombolas que saem para trabalhar em outros lugares, como Seu Tinga, sabem o que é o preconceito, já que a maioria vive entre negros a vida inteira e não notam o racismo que existe na sociedade brasileira. “A parte branca sempre foi preconceituosa com os negros. Eu me achava feliz de ser negro porque na minha patota era feliz. Até que eu me vi como o único negro em uma equipe de geólogos com quem trabalhei, aí que vi o preconceito, eu ficava isolado deles”, explica. Além da venda da castanha-do-pará, que no ano passado gerou 4,9 milhões de reais em renda somente no município de Oriximiná, as famílias contam com o auxílio da Bolsa Família, do governo federal De modo geral, as famílias são muito unidas e o respeito aos mais velhos é uma obrigação: as crianças e até mesmo os adultos pedem bênção aos mais antigos. Raramente falam palavrões e usam um vocabulário limitado para se comunicar - quando o fazem, porque o quilombola não gasta saliva à toa quando não tem nada importante a dizer. Palavras como “espia” e “agonia” são usadas em inúmeras situações e os sentidos mudam dependendo da ênfase do discurso. As portas das casas estão sempre abertas, qualquer um entra e sai, sem muitas formalidades, obedecendo a uma regra simples: deixar o calçado do lado de fora para não arrastar a terra para dentro de casa. Eles jogam tudo pela janela, de restos de comida a líquidos, considerando que o chão absorve e que logo vem um cachorro ou uma galinha para comer qualquer coisa que tenha sido jogada fora. A rede é o objeto mais valorizado, já que serve como casa durante as expedições na mata em busca da castanha e da copaíba, óleo usado na indústria cosmética que se recolhe nas árvores e que são a fonte mais rentável entre os produtos vegetais extraídos. Uma árvore de copaíba pode dar até vinte litros em poucas horas e o litro é vendido a 25 reais. Enquanto com a castanha recebem 40 reais por um caixote de feira cheio delas, obtidas depois de uma manhã inteira de trabalho na mata. A vida simples do quilombola, na qual as crianças e bichos correm livres, não ressente da falta de facilidades como energia elétrica, água encanada ou banheiro. A convivência com essas “dificuldades”, do ponto de vista de quem mora na cidade, é natural para eles. Mas o que sim faria feliz ao quilombola seria matar as saudades dos filhos que moram longe, se pudessem falar com eles pelo telefone. Algo que, em 2014, ainda não podem fazer.

As relações desmedidas entre Cuba e Venezuela


A possibilidade de que o Vaticano medeie o confronto cada vez mais cruento entre o governo da Venezuela e a oposição vinha aumentando nas últimas semanas, mas tanto sua extrema complexidade como o desejo do Vaticano de manter sua atividade mediadora sob o radar da mídia aconselhavam uma discrição extrema. Uma qualidade que não é precisamente a mais conhecida de Nicolás Maduro, que na noite desta quinta-feira, disse em pronunciamento na televisão ao vivo: “Que venha Pietro Parolin! Que venha!”. Referia-se ao atual secretário de Estado do Vaticano e núncio apostólico na Venezuela de 2009 a 2013. A fala de Maduro rompeu a discrição procurada pelo Vaticano e seu porta-voz, o jesuíta Federico Lombardi, não teve mais remédio a não se tratar do assunto, embora encaixando-o novamente nos limites da prudência. “A Santa Sede está disposta a fazer todo o possível pelo bem e pela serenidade da Venezuela, mas é necessário aprofundar mais e ter mais elementos para verificar quais são as expectativas e as premissas para desempenhar um papel útil. É o que está sendo feito nas últimas horas”. Sobre a possibilidade de que seja ninguém menos que o secretário de Estado do Vaticano que assumirá a direção –e o risco—de uma mediação tão difícil, Lombardi não disse nem que sim nem que não: “O cardeal Parolin conhece bem e ama Venezuela e está certamente disposto e desejoso de fazer tudo que está a seu alcance.” A primeira evidência da possível mediação da Igreja ocorreu há dez dias, no que talvez tenha sido um cândido vazamento. Em sua conta de Twitter, o chefe do Comando Estratégico Operacional (CEO) das Forças Armadas Venezuelanas, general Vladimir Padrino López, registrava a visita a seu quartel do novo núncio apostólico em Caracas, monsenhor Aldo Giordano. “Grata e santa visita”, qualificou ao mesmo tempo em que mostrava fotografias em que ambos trocavam presentes. “A paz continua sendo o caminho para Venezuela”, completou. Que o novo núncio –nomeado em outubro passado pelo papa Francisco- estivesse com o principal oficial militar tinha um propósito. Um importante representante da oposição venezuelana, que pediu para não ser identificado, confirmou em Caracas que há meses o Vaticano se prepara para mediar a crise venezuelana. “Giordano colaborou muito e fez seu trabalho. Desde que chegou ao cargo, ganhou a confiança de todos os atores do conflito.” A fonte esclareceu que a mediação seria exercida pelo estado Vaticano, não pela igreja venezuelana, que o regime bolivariano considera, salvo exceções, antirrevolucionária. Isso explicaria, por exemplo, as recentes declarações de Ovidio Pérez Morales, arcebispo da cidade de Los Teques (estado de Miranda) e ainda influente ex-presidente da Conferência Episcopal Venezolana (CEV), em que, mais que uma mediação, segue pedindo abertamente pedia a saída de Maduro e a formação de “um governo de transição, de integração, de união e de salvação”. A propósito da visita durante a semana passada de uma missão especial de chanceleres da Unasul (União das Nações Sul Americanas), o governo venezuelano se disse disposto a aceitar a mediação de um terceiro para dialogar com a oposição. Tanto o presidente Nicolás Maduro como o chanceler Elías Jaua já mencionaram Pietro Parolin como eventual “testemunha” dos diálogos. Em 2013, o papa Francisco recebeu na Santa Sede tanto Maduro como o líder opositor e ex-candidato presidencial Henrique Capriles Radonski. Disse a ele seguia com atenção os eventos na Venezuela e que, para isso, nomeava um de seus melhores homens, o italiano Aldo Giordano, como seu representante em Caracas. Desde sua conversa com o Sumo Pontífice, Maduro cita com frequência episódios e frases dessa visita durante suas longas intervenções na televisão. O governo de Caracas, que define sua revolução bolivariana como “profundamente cristã”, além de socialista, quer achar que a eleição do cardeal Bergoglio significou um giro à esquerda na posição universal da Igreja Católica. O conflito entre o Governo da Venezuela e a oposição, que começou no dia 12 de fevereiro, já causou a morte de 38 pessoas. A mais recente foi a de Roberto Annese, um universitário de 33 anos, que foi morto a tiros na sexta-feira quando participava de uma manifestação em Maracaibo.

Obama nomeará o chefe da cibersegurança da Marinha para a NSA


O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, deve designar o vice-almirante Michael Rogers como o novo diretor da Agência Nacional (NSA). Rogers, cuja nomeação deverá ser confirmada pelo Senado, é o atual chefe da cibersegurança da Marinha e deve chegar ao cargo em um momento em que a agência está sendo amplamente questionada por seus programas de espionagem. Ele terá a tarefa de levar a cabo as reformas da instituição para dar mais transparência a suas práticas e garantir a proteção da privacidade dos cidadãos. “Este é um momento crítico para a NSA e o vice-almirante contribuirá com a agência enquanto ela continua com sua importante missão e executa as mudanças promovidas pelo presidente Obama”, afirmou o secretário de Defesa, Chuck Hagel, no comunicado da nomeação de Rogers. O futuro diretor da NSA é especializado em encriptação informática e atualmente é o responsável pela cibersegurança da Marinha norte-americana. Rogers dirigiu mais de uma dezena de operações de ataque e de defesa informáticas e liderou missões de apoio em criptologia para unidades americanas deslocadas no golfo Pérsico e no Mediterrâneo. Rogers liderou missões de apoio em criptologia para unidades americanas no golfo Pérsico e no Mediterrâneo Rogers sucederá no posto ao general Keith Alexander, quem ficou à frente da NSA nos últimos nove anos. Como Alexander, além da direção da agência, ele será o responsável pelo Cibercomando, uma unidade de hackers do Exército criada em 2009 e que sempre foi comandada pela NSA. Entre as recomendações do grupo de especialistas encarregados da revisão das práticas de espionagem da entidade, aconselhava-se a separação das ambas instituições e que um civil estivesse à frente da NSA. A Casa Branca desde o primeiro momento recusou a proposta. Uma vez anunciado a nomeação por Obama, Rogers deverá passar uma sabatina de um Senado muito dividido em torno do futuro e a extensão dos programas de vigilância da NSA. No Congresso foi apresentada uma proposta de lei, promovida pelos presidentes dos Comitês de Assuntos Jurídicos de ambas câmeras, o congressista republicano James Sensenbrenner e o senador democrata Patrick Leahy, que fatia a extensão das práticas de espionagem da agência, enquanto a responsável pelo Comitê de Inteligência do Senado, Dianne Feinstein, defende a manutenção dos mecanismos, com um aumento dos controles e a superintendência. O número dois da NSA será Rick Leggett, encarregado de avaliar o controle dos danos causados pelos vazamentos de Edward Snowden. Durante uma entrevista ao programa de televisão 60 minutes, Leggett não fechou a porta a uma negociação sobre uma anistia para o técnico de informática, uma possibilidade que na semana foi descartada por completo pelo promotor-geral, Eric Holder. O posto de Leggett não precisa de uma aprovação prévia do Senado.